20 janeiro 2010

Fábrica de vinil é reativada e os "bolachões" ganham força

do blog Clube do Vinyl

Fonte: Fernanda Malta , Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Num galpão de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, uma massa de PVC é inserida em uma grande prensa hidráulica. Com o toque de um botão, duas pastilhas de cem toneladas comprimem o plástico a 160°C. Menos de um minuto, e um balde de água fria depois, as pastilhas se expandem e surge um LP. Esta é a forma como a única fábrica de vinil da América Latina produz discos para gravadoras. Desativada desde 2007, a última fábrica do gênero que sobreviveu à era do mp3 foi a Polysom, que reabre suas portas no fim de janeiro.
De acordo com o presidente da gravadora Deskdisc, João Augusto, que tomou as rédeas da fábrica em abril, os números positivos deram esperanças para salvar o “bolachão” de um passado sem volta.

- Fui motivado pelo fetiche e pela impossibilidade de produzir os próprios vinis da Deckdisc no Brasil. Mas logo descobri que seria um bom negócio, diante das notícias que recebemos do crescimento de vendas do vinil no exterior. Sempre há gente querendo produzir LPs e Compactos por aqui - afirma João.

Reativadas as engrenagens do maquinário restaurado, os primeiros LPs a sair dali serão da Deckdisc: discos de Pitty, Fernanda Takai, Nação Zumbi e Cachorro Grande. A fábrica, no entanto, tem capacidade para produzir 28 mil discos e 12 mil compactos por mês.
Os números falam por si

Em 2007, cerca de um milhão de vinis foram vendidos no mundo inteiro, contra 858 mil em 2006. E não é apenas no Brasil que há o resgate. Nos Estados Unidos, as vendas subiram 35% em 2009, em relação a 2008, de acordo com dados divulgados pela Soundscan, que faz levantamentos de vendas de música e vídeo nos EUA.

O cantor Ed Motta é um dos conhecidos colaboradores a salvar a velha mídia de extinção. Dono de uma coleção de cerca de 20 mil discos, ele acredita que o mercado tem espaço para crescer.

- Agora vai ter tudo o que a gente imaginar, de clássicos do jazz ao último disco da Madonna e da Lady Gaga - prevê. - Não escuto CD nunca, prefiro vinil, pois o timbre do som é mais parecido com som real das coisas. O digital plastifica o som dos instrumentos - conclui.

O advogado Joaquim Cutrim sabe bem o que é ter apego ao vinil. Colecionador de LPs desde 1972, e dono do blog www.vinilnaveia.blogspot.com, ele defende veementemente as vantagens da bolacha:
- O disco me dá a garantia de durabilidade, enquanto que o CD pode estragar em menos de dez anos. Além disso, há muita música que não existe em CD, somente em vinil.

A rádio Roquette Pinto fez, recentemente, uma campanha para quem quisesse se desprender dos velhos discos. O programador musical Ivan Bala, 38, diz que pelo menos cinco mil LPs foram doados.
- O grande lance do vinil é que você se torna íntimo da música. É preciso pegar na agulha, analisar o lado do disco, colocar no ponto certo... Além disso, o encarte é material para pesquisa, enquanto que o CD, na maioria das vezes, nem a data vem escrita - pondera Bala.
Nos camelôs do centro da cidade, o preço do vinil varia entre R$3 e R$ 70, mas pode-se encontrar discos por até R$1.500. É o caso do primeiro álbum de Roberto Carlos, Louco por você, de 1961, que se chegar às barracas, gera até discórdia entre vendedores.

- O mercado do vinil não acaba. Há um grande público, a maioria atrás de música brasileira - garante Wanderlino Oliveira, 64, há dez na Rua Pedro Lessa, no Centro.
Em tempos de pirataria, o vinil tem vendido mais do que o primo cromado. O mercado do CD caiu 17,5% de 2007 para 2008, segundo a Associação da Indústria Fonográfica da América.
- Quem impulsiona o mercado nacional é a mídia de fora, como Radiohead e Madonna, que lançam em CDs e vinis - diz Márcio Rocha, 35, dono da loja de vinil Tropicália.
DJs e festas retrôs ajudam a resgatar os vinis

Em plena era digital, quando a indústria fonográfica assiste boquiaberta à proliferação das trocas de arquivo pela Internet e à queda do CD, os velhos “bolachões” ressurgem no interesse de uma geração que nasceu junto com os CDs. Os jovens estão garantindo o novo culto ao vinil junto aos DJs, que cada vez mais, resgatam antigas canções nas pick-ups.

Um deles é Tekko, 55 anos, DJ do programa Conexões Urbanas na rádio Roquette Pinto e também um dos diretores do Affroreggae. Para ele, o vinil nunca saiu de moda.
- O CD que perdeu o glamour - garante Tekko. - O vinil resgata o sentimento de amor que temos à música, o CD nunca propôs isso. O maior problema dos discos é o transporte. Às vezes eu saio de casa com uma bolsa cheia de vinis debaixo do braço para tocar em até três lugares diferentes, mas eu prefiro isso do que ouvir um som cheio de ondas digitais - argumenta.
Outro benefício que Tekko credita aos vinis é a questão do aumento dos seus conhecimentos musicais.

- Você acaba ouvindo uma música sem querer. Não existe o botão de replay, então não tem aquela coisa de conhecer só duas músicas de um artista - garante.
A estudante Maria Carolina Barreto, 21 anos, concorda.
- Gosto da aleatoriedade que a vitrola possibilita. É interessante reparar na sequência das músicas, com o CD você acaba apertando os botões para escolher as preferidas.

Vinil é convidado VIP em festa
O repertório da festa carioca Vinil é arte, que acontece no centro da cidade, uma vez por mês, varia entre raridades de grandes nomes da música e clássicos em versões inusitadas, do samba ao jazz. A festa é produzida por um coletivo de DJs que tem como premissa a pesquisa e coleção de discos de vinil. Formiga é um dos quatro responsáveis por animar as edições da festa, que reúne um grande número de colecionadores.

- Eu levo umas duas horas para preparar o set de cada noite, enquanto que um cara que toca com CDs leva todos os discos que tem e resolve na hora o que vai tocar. Eu levo no máximo 100 e já sei mais ou menos o encaminhamento. Por isso, cada festa conta com um set list diferente, não tem noite igual - explica.

A festa já passou por diversos endereços e hoje acontece uma vez por mês na Gafieira Elite.

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